Meu nome é Dayane Wendy, tenho 34
anos, moro em Marília, interior de São Paulo, e sou mãe do Gabriel. Estudo Psicologia e, hoje,
também sou fundadora do projeto Forte e Corajosas –
Mães Atípicas, mas antes de chegar até aqui… houve um
caminho profundo, real e cheio de pequenos milagres.
Minha experiência na
maternidade começou em 2015, quando descobri que estava grávida do Gabriel. Eu
era muito magrinha, e a descoberta veio com dois meses de gestação. A gravidez
foi tranquila, mas logo descobrimos que o Gabriel tinha uma síndrome chamada BOR – Bráquio Otorrenal, que pode afetar audição, visão e rins.
No caso dele, surgiram apenas as fístulas na garganta e na orelhinha, sem
nenhuma alteração auditiva, visual ou renal. O geneticista confirmou:
“Ele não tem comprometimentos nos órgãos. Apenas
as características físicas.”
E assim começamos nossa jornada.
Quando chegou a fase da
introdução alimentar, algo me inquietou profundamente. O Gabriel vomitava tudo.
Ele não aceitava texturas, sabores, nada sólido. Qualquer coisa que eu tentava,
ele regurgitava. Ao mesmo tempo, aquilo que ele havia começado a fazer — como
imitar sons de bichinhos — também se perdeu com o tempo.
Os médicos diziam: “Mãe, capricha na comida. Ele não tem nada.”
Mas eu sabia que tinha.
A maternidade afina os sentidos.
A gente escuta antes das
palavras, percebe antes dos diagnósticos.
Foi então que me lembrei
do que eu estudava lá em 2012, antes de trancar a faculdade: autismo.
Olhei para o meu filho e reconheci traços.
O coração da mãe sabe.
Comecei a correr atrás:
neuro, T.O., avaliações. E, ao longo dos anos, veio a confirmação: Gabriel
realmente era autista. Não porque me disseram, mas porque eu lutei por ele. Desde os dois anos e
meio ele faz terapia — todas as terapias possíveis — para garantir qualidade de vida.
Hoje, o Gabriel tem nove anos, é uma criança não oralizada e se alimenta
exclusivamente de leite. Ele
não aceita nada sólido e nada que altere cor ou sabor. Isso exige constância,
paciência e fé. Exige tempo. Exige entrega. Exige uma
mãe inteira.
Por muito tempo, dediquei
100% da minha vida a ele.
E, nesse processo,
conheci a solidão que só as mães atípicas entendem.
Com a sensibilidade ao
barulho, eu não conseguia levar o Gabriel a lugares simples: mercado, shopping,
festas. A sociedade não está preparada para lidar com o diferente. Às vezes
olha com estranhamento. Às vezes cochicha. Mas eu sempre fui firme: meu filho não seria privado de viver o mundo.
Alguns dias davam muito
certo.
Outros, muito errado.
Mas desistir nunca foi uma opção.
Quando entendi que o
Gabriel era autista, eu recebi o diagnóstico como solução, não como peso.
Diagnosticado, ele poderia ser ajudado.
Não era sentença; era porta aberta.
Nesse processo, uma
descoberta ainda maior aconteceu dentro de casa: meu marido, o Jurandir, viu na
história do Gabriel a sua própria infância — seletividade alimentar, atraso de
fala, sensibilidade. E então ele também recebeu o diagnóstico: suporte 1.
O Gabriel é suporte 3.
São dois mundos
diferentes dentro da mesma casa.
E muita gente não faz ideia da força que isso exige
de uma mulher.
Com a dedicação exclusiva
ao Gabriel, o tempo foi me engolindo: deixei de me arrumar, ganhei peso, parei
de olhar para mim. Um dia, diante do espelho, percebi:
eu precisava resgatar a Dayane.
A mulher.
A esposa.
A amiga.
A estudante.
Aquela que sonha.
Nas salas de espera das
terapias, eu via mães chorando. Mães cansadas. Mães feridas pelo preconceito.
Mães implorando por avanços simples — uma nova palavra, um alimento aceito, um
olhar de respeito.
E eu senti a dor delas
dentro de mim.
Foi então que algo queimou no meu coração:
“Seja forte e corajoso” — Josué 1.9.
Essa Palavra virou movimento.
Virou encontro.
Virou resgate.
Virou propósito.
E assim, dessa caminhada
intensa entre amor, fé, lutas e descobertas, nasceu dentro de mim o desejo de
criar algo que acolhesse outras mulheres como eu — algo que devolvesse
identidade, esperança e força às mães atípicas.
Essa iniciativa hoje tem nome.
E mudou a minha vida.
Por ora, deixo aqui o
começo da minha caminhada:
a história de uma mãe que descobriu que a maternidade atípica não destrói sonhos.
Ela os reinventa.
E, mesmo com desafios
diários, ela nos ensina algo profundo:
desistir nunca é uma opção.

